Em
áudio de sessão sigilosa, aliado diz ter testemunhado conversas sobre abandono
do mandato
SÃO
PAULO E BRASÍLIA. “Não renunciarei! Repito: não renunciarei! Sei o que fiz e
sei da correção dos meu atos”. A fala contundente do presidente Michel Temer na
tarde do dia 18 de maio escondia o fato de que o término antecipado de seu
governo tinha sido seriamente discutido nas tensas horas que se seguiram à
revelação de que ele havia sido gravado de forma comprometedora no porão do
Palácio do Jaburu.
Auxiliares
confirmaram reservadamente à época que uma carta de renúncia chegou a ser
redigida, mas o texto acabou nunca vindo a público. Oficialmente, ela nunca
existiu. Áudio de uma sessão sigilosa da Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) da JBS obtido pelo jornal “Folha de S.Paulo” revela, no entanto, um dos
principais aliados de Temer afirmando ter testemunhado, dentro do gabinete
presidencial, a quase renúncia.
“Ele
quase derrubou o presidente naquele dia 17. O complô era pro dia 18 o
presidente renunciar. Quase conseguiu fazer o presidente renunciar! (Eleva a
voz) E quem tá lhe falando é quem estava dentro do gabinete!”. A fala é do
relator da CPI, Carlos Marun (PMDB-MS), um dos mais estrepitosos defensores de
Temer no Congresso, integrante da tropa que liderou a rejeição das duas
denúncias da Procuradoria Geral da República contra o presidente.
O
áudio é da sessão secreta do dia 18 de outubro, quando a comissão ouviu o
depoimento do advogado e delator da JBS, Francisco de Assis e Silva. O “ele” a
quem Marun se refere é Joesley Batista, responsável por gravar Temer.
O
deputado do PMDB sugere, na sessão, que Assis e Silva aconselhe o dono da JBS,
seu chefe, a fazer uma nova delação, revelando como foi o processo de
negociação e obtenção de provas da colaboração que gerou uma crise política na
atual gestão. O recado é para que Joesley, que está preso desde setembro
suspeito de ter omitido informações em sua delação, delate agora o então
procurador geral da República Rodrigo Janot, que comandou o acordo dos
executivos.
Aliados
de Temer sustentam que Janot tinha o objetivo de derrubar o governo e que, por
isso, induziu e orientou de forma ilegal toda a produção de provas. “A flecha
saiu pela culatra”, ironizou Marun, em referência à frase do ex-procurador
geral – “enquanto houver bambu, lá vai flecha” – de que continuaria
apresentando denúncias até o último dia de sua gestão (17 de setembro).
Na
sessão secreta, Assis e Silva defendeu a delação firmada por ele e os outros
seis executivos da JBS. O advogado não quis responder qual foi exatamente a
participação do ex-procurador Marcello Miller, pivô da polêmica que fez Janot
pedir a suspensão dos benefícios de Joesley e Ricardo Saud. Assis e Silva
alegou que esse assunto tem de ser preservado por sigilo profissional, já que,
além de delator, ele foi o advogado dos acordos assinados.
Outro
lado. Ao jornal “O Globo”, Marun confirmou a afirmação na CPI, mas disse que
não viu carta de renúncia presidencial. “Eu nunca vi carta nenhuma e, se
tivesse visto, teria rasgado. Mas, de fato, alguns assessores ficaram muito
abalados, criou um ambiente muito difícil. Alguns agentes políticos externos
passaram a defender a renúncia, foi um momento muito tenso”, disse.
O
relator da CPI disse que entrará em contato com a Polícia Legislativa e pedirá
a abertura de uma investigação sobre o vazamento de sua fala à sessão secreta
da CPI: “Lamento que tenha havido esse vazamento. Vou pedir providências sobre
isso”.
Procurado,
Temer negou que tenha pensado em renunciar. “Prezada jornalista, não, isso
nunca ocorreu”, escreveu a assessoria de imprensa do Planalto.
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